terça-feira, 29 de setembro de 2009

Imagens

Abraço com cabeça no ombro e cheiro no fim.
Morango com leite condensado.
Cheiro de bolo recém saído do forno.
Tomar café em dia frio.
Barulhinho de mar.
Mãos no cabelo descendo pra nuca.
Cheiro de terra molhada pela chuva.
Unhas arranhando as costas levemente.
Água gelada depois de uma longa caminhada debaixo do sol forte.
Comidas de festinha de criança.
Deitar à noite na areia da praia, com gente querida, e ver estrelas.
Vento no rosto andando de bicicleta.
A festa que nosso cachorro faz quando chegamos em casa.
Cheiro de alho fritando no azeite.
Mar alaranjado quando o sol se põe.
Mar avermelhado quando o sol nasce.
Sentir seu abraço mesmo quando você não está aqui.
Achar o tempo sempre curto para te dizer qualquer coisa.
Ver muitos corações no caminho onde há você.

Adélia Prado


O amor quer abraçar e não pode.
A multidão em volta,
com seus olhos cediços,
põe caco de vidro no muro
para o amor desistir.

O amor usa o correio,
o correio trapaceia,
a carta não chega,
o amor fica sem saber se é ou não é.

O amor pega o cavalo,
desembarca do trem,
chega na porta cansado
de tanto caminhar a pé.

Fala a palavra açucena,
pede água, bebe café,
dorme na sua presença,
chupa bala de hortelã.

Tudo manha, truque, engenho:
é descuidar, o amor te pega,
te come, te molha todo.

Mas água o amor não é.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Casa de vó



Quase fim de tarde: hora de tomar uma xícara de café com o bolo de laranja mais gostoso do mundo. Faz silêncio em casa e na vizinhança. Entra a minha luz preferida, a da tardinha, por várias direções – aqui tem muitas portas amplas. Minha avó também cumpre seu ritual: acende um cigarro na varanda enquanto observa seu jardim. Nunca mais me falou do beija-flor, freqüente visitante durante alguns anos que lhe lembrava sua mãe. Ofereço-lhe meu café, quero ficar mais perto, deslizo meus dedos pequenos entre suas mechas de cabelo e cheiro sua pele, nas proximidades do ombro. Um carinho que nem sempre ela encontra espaço em seu denso mundo de angústia – o peso que carrega por ser a grande loba da matilha, as nossas entranhas e salvação. Ainda que seja sempre ímpeto, sua casa transborda paz. E, aqui, faço-me parte da ordem, figura constituída. Sinto o chão e o teto. Durmo ao seu lado, como nos tempos de infância, quando acordava no meio da noite para ver se a grande loba, minha mãe terra, continuava a respirar. Aqui, o dia faz mais sentido que a noite. Sou mais Sol, mais próxima do azul. Corpo em frente à lareira, mil comidinhas, sopa deliciosa com torradas, três cães, quatro gatos. Irmã, avô, tia e a avó que é mãe-terra. Minha base, minha família. A referência que me faz forte.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Descansa coração



"Cansei de tanto procurar
Cansei de não achar
Cansei de tanto encontrar
Cansei de me perder

Hoje eu quero somente esquecer
Quero o corpo sem qualquer querer
Tenhos os olhos tão cansados de te ver
Na memória, no sonho e em vão

Não sei pra onde vou
Não sei
Se vou ou vou ficar
Pensei, não quero mais pensar
Cansei de esperar

Agora nem sei mais o que querer
E a noite não tarda a nascer
Descansa coração e bate em paz"

Composição: Simons & Marques / Alberto Ribeiro
Versão escutada: Fernanda Takai

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Into the wild I

De joelhos não é uma maneira de ser livre
Levantando um copo vazio, pergunto silenciosamente:
Todos os meus destinos aceitação aquele que realmente sou
Para que eu possa respirar?

Círculos que crescem e engolem pessoas completamente
(...)
Uma mente cheia de perguntas, e um professor em minha alma
E por aí vai...

Não se aproxime ou terei que ir
Tal como a gravidade, são esses lugares que me puxam
Se alguma vez houve alguém para me manter em casa
Seria você...

Todos que encontro, em gaiolas que compraram,
Pensam sobre mim e minha vida errante,
Mas eu sou o que eles nunca pensaram.
Eu tenho a minha indignação, mas sou puro em todos os meus pensamentos
Eu estou vivo...

Vento em meus cabelos, sinto-me parte de todos os lugares
Sob o meu ser, há uma estrada que desapareceu
Tarde da noite, eu ouço as árvores
Elas estão cantando com os mortos no alto...

Deixe comigo que eu encontro um jeito de ser
Considere-me um satélite, sempre orbitando
Eu conhecia todas as regras, mas as regras não me conheciam
Com certeza...


(tradução da música "Guaranteed" de Eddie Vedder - trilha sorona do filme "Into the wild")

quarta-feira, 9 de setembro de 2009


"E naquele momento evitava precisamente a solidão, que seria uma bebida forte demais."
Clarice Lispector


fragmentos I

*

Minha desordem não é camuflada.
A casa inteira reflete meus congestionamentos e inflamações.
Nem caibo aqui.

*

Tenho mãos pequenas.
Mostro o quão são ásperas,
Quando o menino dos olhos apertados
Diz gostar delas.

*

Um corpo rejeitado
Debruçou-se sobre a cômoda
E vomitou seu inferno num lenço de papel.

Ela disse a mim:
Mil sóis para secar o suor dele da sua pele
(Uma poesia no chão rachado daquele lugar).

*

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

A lua, o jazz e meus olhos



Por Sarah, manuscrito em pleno jazz da ribeira, quando meus olhos (tristes?) conseguiram inspirar...