quarta-feira, 2 de julho de 2008

Quase três horas da manhã. Todos os cômodos da casa estão escuros, exceto por aqui, ao meu redor, com essa luminária cor de prata acesa. A cidade é lavada impiedosamente por uma chuva ininterrupta. É água tomando conta de tudo e a gente acaba ficando mais só, assim, sem muita escolha. Gosto quando a natureza põe as coisas em seus devidos lugares e mostra quem controla quem. Fernando Pessoa se vestia de Alberto Caeiro em dias mais céticos – nem por isso menos poéticos – e defendia que não há mistério algum no mundo, que tudo está de acordo e vale à pena. É, tem dias em que também acordo meio Caeiro, mas hoje não. Hoje eu me pego pensando nesse indizível da matéria do mundo, sentindo uma inquietude por estranhar essa coerência tão incoerente do espaço e da vida residente nele, a vida com prazo de validade que teimamos em eternizar.
Um café alivia o frio tal qual um abraço ou um deitar no peito de quem amamos. E aí chegamos a pensar ser nesse novelo bom de sensações que o significado de tudo se dá e se finda. No entanto, quando estamos sós, muita coisa parece se desconstruir ao passo em que engolimos o mundo com ansiedade (ou nós somos engolidos por ele?) – fragmentos de certezas descartadas por todo o corpo ou nosso corpo desfragmentado em certezas invisíveis.

3 comentários:

Anônimo disse...

"nosso corpo desfragmentado em certezas invisíveis" , filosófico e lindo, um olhar, uma leitura do que são as águas pela peneira...são "certezas invisíveis", certezas que se desfragmentam, diluídas na chuva de natal. E nós nos diluímos junto...
Íntimo, profundo, simbólico, um retrato de emoções sobre a vida.

Anônimo disse...

eu adoro chuva. olhar pra chuva. cheirar a chuva.tomar banho de chuva.

mas o que mais me agrada na chuva, é o silêncio. já percebeu o silêncio do mundo quando está chovendo?

;)

Saga disse...

estas magrugadas que nos torturam...